O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) solicitou estudos para avaliar a viabilidade de estabelecer tarifa zero ou gratuidade nos ônibus urbanos em todo o Brasil. A medida incluiria a isenção de pagamento de passagens em dias específicos (domingo e feriado) ou de forma mais ampla.
A ideia parte de preocupações com o aumento das tarifas, queda da demanda por transporte coletivo, além das desigualdades no acesso à mobilidade, especialmente para população de baixa renda.
Há também componente político: benefício visível para as pessoas, que pode reforçar a imagem do governo; o debate tem sido aquecido em vista das próximas eleições.
. O que se está propondo exatamente
Alguns dos modelos em análise ou já em curso incluem:
Gratuidade total aos domingos e feriados para o transporte público municipal ou intermunicipal. �
Versões parciais ou tarifadas simbolicamente, ou seja, tarifas reduzidas ou isenção para determinados públicos ou em determinados tipos de dias.
O governo avalia como financiar essa gratuidade, considerando diferentes fontes ou modelos de cooperação entre União, estados e municípios.
3. Experiências já existentes como referência
No Distrito Federal, há o programa “Vai de Graça”, que instituiu a gratuidade no transporte público aos domingos e feriados. A medida mostrou alguns efeitos positivos: aumento da circulação de pessoas, fortalecendo o comércio, lazer, cultura; impacto também na emissão de notas fiscais eletrônicas; e até efeitos no índice de preços (IPCA) no grupo transportes.
Em São Paulo, foi implementado “Domingão Tarifa Zero”, medida semelhante que já evidencia aceitação.
Em Maricá (RJ), existe tarifa zero universal em alguns modelos de transporte municipal há vários anos; a experiência é uma das mais citadas como modelo de sucesso.
4. Custos estimados e implicações fiscais
Um estudo da Warren Investimentos estimou que, se a União arcasse 100% do custo da gratuidade nos domingos e feriados em todo o Brasil (exceto São Paulo, no caso da estimativa), o valor anual pode chegar a R$ 4,3 bilhões.
Nos casos de capitais ou municípios grandes, a necessidade de investimentos adicionais em frota, manutenção, ajustes de operação pode elevar ainda mais os custos. Isso inclui custo com pessoal, combustível, infraestrutura de apoio etc.
Há pressão orçamentária: o governo precisa equilibrar isso com outras prioridades (saúde, educação, segurança) e cumprir metas fiscais (como déficit primário, controle de gastos públicos).
Potenciais benefícios
Inclusão social: para pessoas que hoje deixam de usar ônibus em finais de semana ou feriados por causa da tarifa, ou simplesmente se limitam nos deslocamentos de lazer ou acesso a serviços; há economia direta no orçamento doméstico.
Estimulo ao comércio, lazer e turismo local: nas cidades com gratuidade em dias específicos, lojistas relatam aumento significativo do movimento. No DF, 96% dos lojistas reportaram mais clientes nos dias com transporte gratuito.
Melhor aproveitamento urbano, fortalecimento de espaços públicos, cultura, turismo interno.
Possível efeito antiinflacionário em relação ao indicador de transporte urbano nos dias com gratuidade, embora esse efeito dependa de escala e de quanto a política substitui o uso de transporte privado por coletivo.
6. Desafios, riscos e fatores críticos
Capacidade de operar com gratuidade: se houver grande crescimento de demanda, o sistema pode ficar sobrecarregado, com lotações, atrasos, queda de qualidade. É necessário reforço da frota, manutenção, adequação de horários.
Financiamento sustentável: encontrar fontes de receita contínuas para cobrir o custo da gratuidade, sem depender de “salvamentos” ou subsídios excepcionais; criar modelos fiscais ou fundos específicos, parcerias federativas, etc.
Impacto orçamentário: gastar bilhões pode implicar cortes em outras áreas ou necessidade de aumentar receitas; risco de descumprimento de metas fiscais.
Desigualdade entre municípios: cidades com poucos recursos podem ter dificuldade de arcar com os custos, ou de acompanhar o aumento da demanda. A capacidade de mobilização fiscal local varia muito.
Gestão e qualidade do serviço: gratuidade não resolve problemas de atraso, conforto, cobertura, frequência; se o serviço for ruim, pode haver resistência ou queda de confiança.
Efeitos sobre outros modais e linhas intermunicipais: se só ônibus municipais forem contemplados, haverá necessidade de articulação com trilhos, metrôs, trens, ou transporte interestadual, para evitar distorções.
Alternativas e caminhos intermediários
Gratuidade limitada a dias específicos (domingo, feriado) como fase piloto ou modelo inicial. Permite avaliação de impactos práticos antes de ampliar para todos os dias.
Tarifa simbólica / redução parcial em vez de isenção total: para diminuir impacto fiscal ou operacional.
Segmentação: por renda, por zonas, categorias (estudantes, pessoas de baixa renda) ou por faixa de horário.
Modelos de financiamento: uso de recursos extratarifários (publicidade, uso comercial de infraestrutura de transporte, terminais, taxações), criação de fundos específicos, parcerias entre União / estados / municípios.
Planejamento prévio: dimensionar frota, ajustar contratos com empresas de ônibus, prever demanda adicional.
8. Como isso se compara a outros países ou modelos internacionais
Muitos países europeus e em outras partes do mundo oferecem transporte público gratuito ou fortemente subsidiado em dias de menor demanda ou com políticas específicas de mobilidade urbana.
As políticas internacionais também mostram que gratuidade por si só não resolve todos os problemas: é necessário que haja uma rede de transporte eficiente, integração entre modais, boas condições de infraestrutura, segurança, regularidade, etc.
Cenário provável e próximos passos
O governo deve receber os estudos técnicos elaborados pelo Ministério da Fazenda (por meio de Haddad) para avaliar custos, impactos orçamentários e operacionais.
Possibilidade de anúncios de testes ou fases-piloto em algumas cidades ou regiões antes de escalar nacionalmente.
Discussão legislativa para definir leis ou regulamentos que garantam respaldo jurídico para os subsídios, fontes orçamentárias, responsabilidades dos entes federativos.
Monitoramento dos impactos sociais, econômicos e financeiros para aferir se os benefícios compensam os custos, e ajustes conforme os resultados.
Conclusão
A proposta de gratuidade do transporte público estudada por Lula sinaliza uma política que pode gerar impactos positivos significativos: maior acesso à mobilidade, inclusão social, estímulo ao lazer e comércio local, beneficio para quem mais sofre com tarifas caras. No entanto, não é algo trivial. Os custos são elevados, as demandas logísticas e operacionais são grandes, sobretudo em cidades maiores e regiões com transporte público mais complexo.
Para que a medida seja bem-sucedida, será necessário que haja:
planejamento bem feito
fontes financeiras claras e sustentáveis
reforço operacional (frota + manutenção + qualidade)
fases-piloto para testar os modelos
compromisso de acompanhamento, ajustes e transparência
A gratuidade nos domingos e feriados pode ser vista como um passo inicial concreto — viável em muitos lugares — para depois se evoluir (se for o caso) para formas mais amplas.
Créditos (Imagem de capa): Proposta de ‘ônibus de graça’ é analisada pelo Governo Federal – Foto: Montagem feita com imagens da Agência Brasil e de Ricardo Stuckert/ND